CAREN BOHAN
da Reuters, em Washington
A idéia cada vez mais disseminada de que a disputa democrata pela nomeação é uma questão racial diminui o apoio dos eleitores negros a Hillary Clinton. No início da campanha, a senadora contava com o apoio dos afro-americanos --fruto da popularidade de seu marido, o ex-presidente Bill Clinton, entre este público.
Alguns acusam Hillary de tentar desenhar seu oponente, Barack Obama, como um candidato de apelo limitado para marginalizar sua candidatura e aumentar suas chances de ganhar a nomeação do partido democrata.
Obama será o primeiro presidente negro dos EUA, caso seja eleito. Ele lidera a corrida democrata com uma vantagem de 139 delegados, segundo dados da rede de televisão CNN. Hillary seria a primeira mulher a ocupar a Casa Branca.
A sugestão de Hillary para a formação de uma "chapa dos sonhos" com Obama como seu vice-presidente lembrou aos afro-americanos os tempos em que os negros, considerados como cidadãos de segunda classe, podiam sentar-se somente nos bancos de trás dos ônibus.
"Sem ofensa, mas é típico que a pessoa branca ofereça o segundo lugar, e diga que ficará com o primeiro", afirmou o caminhoneiro Jasper Clark, em um recente evento de campanha de Obama em Jackson, Mississippi. Neste mesmo dia, a mera menção do nome de Hillary causou vaias do público majoritariamente negro.
Obama tenta ganhar popularidade discutindo sua ascendência como o filho de uma mulher branca de Kansas e um homem negro do Quênia. Ele quer destacar sua mensagem de que os Estados Unidos podem ir além das divisões raciais, mas o assunto continua surgindo.
Polêmica dos assessores
Os dois lados acusaram-se de ter injetado a questão racial na campanha. Na semana passada, eles trocaram ataques sobre a polêmica envolvendo Geraldine Ferraro, uma ex-assessora de Hillary que foi a primeira candidata ao cargo de vice-presidência em 1984.
Em comentários que alguns viram como preconceituosos, Ferraro atribuiu a liderança de Obama ao fato deste ser negro. Mais tarde, ela demitiu-se da equipe de Hillary. A senadora repudiou seus comentários e disse "arrepender-se profundamente".
Já a campanha de Hillary acusa Obama de trazer o assunto racial de volta a tona quando chamou a atenção repetidamente para os comentários de Ferraro. Alguns analistas dizem que Ferraro poderia provocar ressentimento de alguns americanos brancos sobre as propostas de políticas de inclusão voltadas para ajudar minorias a superar a discriminação.
Muitos negros norte-americanos dizem que tal ressentimento acaba ofuscando os feitos dos candidatos. "É a idéia de que uma pessoa negra com uma graduação de direito em Harvard e uma carreira legislativa distinta somente chegou lá por sua cor. Isso é surreal", criticou William Jelani Cobb, professor de história em um colégio de Atlanta.
"É comparável ao mesmo argumento cansativo que profissionais negros bem sucedidos ouvem: 'Ela ou ele só chegou lá por causa de políticas inclusivas'", completou Patricia Gunn, professora de direito da Universidade de Ohio que apoia Obama.
Queda nas pesquisas
Nas pesquisas, Hillary tem dividido o apoio do eleitorado negro com Obama. Mas muitos consideraram ofensiva a comparação feita por Bill Clinton após a vitória de Obama na Carolina do Sul. Ele disse que a situação assemelhava-se à vitória de Jesse Jackson, um afro-americano que concorreu a Presidência em 1984 e 1988, mas atraiu pouco apoio na escala nacional.
Alguns disseram que os comentários de Clinton foram uma tentativa de marginalizar Obama como o único candidato negro nos Estados Unidos. Hillary pediu desculpas na semana passada pelo marido.
Mas sua popularidade entre os negros continua a cair. Na Carolina do Sul, oito em dez negros apóiam Obama. Esta margem aumentou para mais de nove em dez na primária do Mississippi.
A equipe de Obama espera que esta mensagem de transcender a divisão racial traga apelo de todo o país. Eles enfatizam que suas vitórias foram não só em Estados de maioria negra, mas principalmente em locais como Iowa, Wiscosin e Idaho que contam com grande eleitorado branco.
Obama está enfrentando uma controvérsia em sua própria campanha. Seu antigo pastor da Igreja de Chicago, reverendo Jeremiah Wright afirmou que os Estados Unidos acreditam "na supremacia branca e na inferioridade negra". O candidato, que freqüentou a igreja por 20 anos, rejeitou os comentários de Wright que classificou como "incendiários".
Em um evento de arrecadação de verbas, no sábado (15), Obama relacionou os comentários de Ferraro e Wright como política do passado: "Nós continuaremos lutando com estes demônios".
www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u382648.shtml
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