Presidente do IPCC descarta teto de CO2, mas pede que País, China e Índia não repitam erros de ricos
Jamil Chade, do Estadão
AP
O presidente do IPCC, Rajendra Pachauri
GENEBRA - O presidente do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), Rajendra Pachauri, pede que Brasil, China e Índia não repitam os mesmos erros dos países ricos no desenvolvimento de suas economias nos próximos anos, mas alerta que não seria o momento ainda de estabelecer tetos de emissões de CO2 para os países emergentes.
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Em uma entrevista por teleconferência concedida nesta sexta-feira, 12, após saber que havia recebido o Prêmio Nobel da Paz, o indiano também falou sobre a Amazônia e sugeriu a criação de um tratado internacional para garantir a cobertura florestal no planeta. Ele alertou ainda que a deterioração do meio ambiente pode se transformar em risco para a paz.
Pachauri dividiu o Prêmio Nobel da Paz de 2007 com o ex-presidente e candidato derrota à presidência dos EUA Al Gore.
O presidente do IPCC deixa claro que não está na hora de o mundo criar tetos para as emissões de CO2 nos países emergentes, como Brasil, China e Índia. "As responsabilidades devem ser diferentes para cada país. Há muitas pessoas ainda nesses países emergentes que sequer tem acesso à energia. Temos de cuidar para que essas necessidades sejam supridas também. Por isso acredito que de fato não é a hora de o estabelecimento de metas de emissões", afirmou Pachauri, respondendo a uma questão do Estado.
O debate sobre a responsabilidade dos governos está no centro da disputa diplomática em torno de um novo tratado ambiental. Brasil e outros emergentes se recusam a aceitar obrigações de corte de emissões, alegando que historicamente os responsáveis são os países ricos. Para Berlim, Washington ou Tóquio, sem um teto nas emissões dos emergentes, o problema jamais será solucionado.
Segundo ele, porém, isso não significa que os países emergentes não tenham de ter novas responsabilidades. "O que os países emergentes não podem é repetir o mesmo padrão de desenvolvimento conduzido pelos países ricos nas últimas décadas", afirmou o presidente do IPCC.
Na avaliação de Pachauri, está na hora de a comunidade internacional pensar em um modelo de sociedade com menor emissões de CO2. "Uma das idéias que defendemos é uma taxa sobre o carbono. Se isso for instaurado, as empresas irão ver o benefício de buscar novas tecnologias mais limpas e mudar seus padrões. Os consumidores também farão essa opção. A realidade é que governos e empresas precisam se unir e criar uma política coerente. Nenhuma empresa irá agir isoladamente", disse.
Questionado pelo Estado sobre as políticas do governo brasileiro na Amazônia, Pachauri evitou fazer críticas diretas. "Não vou comentar o que o governo brasileiro deve fazer", disse. "Mas florestas como a Amazônia são as maiores fontes naturais para a captação e seqüestro de carbono. Se não mantermos essa floresta, então estaremos em uma situação de risco. No futuro, devemos ter políticas claras e mesmo um acordo internacional para garantir a cobertura florestal aumente no mundo e não apenas que o desmatamento seja freado", defendeu.
Etanol
Pachauri também falou sobre combustíveis alternativos. Segundo ele, os governos ainda precisam analisar com cuidado os efeitos da produção do etanol antes de embarcar no projeto. "Devemos analisar com cuidado os efeitos dos biocombustíveis e decidir quais são as melhores opções", disse. Pachauri não nega que o etanol possa ter efeitos positivos para o clima. Mas alerta que nem todos os locais ou economias terão como desenvolver essa solução. "Precisamos garantir que não haja um conflito com a produção de alimentos", disse.
Em sua avaliação, a solução seria utilizar terras que hoje não são destinadas à produção de alimentos para que sirvam para o etanol. Isso não significa, porém, o desmatamento de novas terras. "Além disso, temos de garantir que a produção do etanol gere aos agricultores a mesma renda que um produtor de alimentos consegue obter com seu cultivo", disse Pachauri.
Paz
Para Pachauri, a tendência é de que as condições climáticas e ambientais afetarão cada vez mais a estabilidade no mundo e, portanto, será uma ameaça à paz internacional. "Questões como paz e estabilidade podem ser afetadas pelas mudanças climáticas. Vivemos já em um mundo muito desigual e injusto. Se além disso temos agora o impacto das mudanças climáticas, os efeitos serão sentidos na própria capacidade de certas populações se manterem vivas. Há muitos locais hoje vulneráveis no mundo e que serão duramente afetados", disse. "Prevemos inclusive que haja movimentos populacionais pelo mundo por causa da mudança do clima e, se isso ocorrer, poderemos ser confrontados com um caso social. Por isso é que acredito que as mudanças climáticas podem de fato ser uma ameaça à paz mundial", avaliou Pachauri.
Vinte anos após a criação do IPCC, Pachauri alerta que o prêmio Nobel recebido pela entidade deve ir para todos os cientistas que trabalharam para a elaboração e estudos sobre o impacto do clima no mundo. "Todos os 600 cientistas que trabalham no IPCC são os vencedores hoje. Se não fosse a comunidade científica, não teríamos chegado tão longe hoje nas nossas descobertas", afirmou. "Mas agora o prêmio nos dá mais responsabilidades para que façamos mais e que a ciência continue dando explicações", disse.
Al Gore
Segundo Pachauri, Al Gore ainda teve o papel crucial em divulgar a mensagem sobre o clima ao público. 'Seu compromisso é de fazer com que o mundo tenha o conhecimento do que está ocorrendo e é um privilégio para nós dividir o prêmio com ele", afirmou o indiano. Pachauri contou que foi o próprio Gore quem ligou para ele para comemorar o prêmio e sugeriu uma reunião entre os dois para planejar como poderão trabalhar juntos.
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